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Estudo da UFPB revela comércio ilegal de peixes ornamentais no Facebook

Durante seis meses, foram registrados 1.121 anúncios de venda
publicado: 13/08/2020 20h12, última modificação: 13/08/2020 20h12
O peixe cascudo-zebra, criticamente ameaçado de extinção, foi uma das espécies identificadas em anúncios de venda em grupos do Facebook. Foto: Autor Desconhecido

O peixe cascudo-zebra, criticamente ameaçado de extinção, foi uma das espécies identificadas em anúncios de venda em grupos do Facebook. Foto: Autor Desconhecido

Um estudo inédito realizado por pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) revela comércio ilegal de peixes ornamentais marinhos e de água doce em grupos do Facebook. A pesquisa foi desenvolvida pela mestre em Ciências Biológicas, Anna Karolina Martins, sob orientação dos professores Rômulo Nóbrega e Tacyana Ribeiro.

De acordo com a pesquisadora, os grupos do Facebook funcionam como um mercado virtual, apesar da própria plataforma proibir o uso de suas ferramentas para o comércio de animais.

Durante seis meses, foram registrados 1.121 anúncios de venda de peixes ornamentais na rede social. A maioria deles tinha origem na região Sudeste do país (83% do total), concentrados principalmente nos estados de São Paulo (60%) e Rio de Janeiro (20%).

“Verificamos que, em 94% dos anúncios, os compradores deveriam retirar os animais diretamente com o vendedor. Entretanto, 6% dos anúncios ofereciam o envio dos animais através dos Correios, prática que é proibida pela lei Postal brasileira”, afirma a pesquisadora.

Os anúncios registrados ofereciam mais de 5 mil peixes, pertencentes a 609 espécies. “Constatamos que foram anunciadas mais espécies de peixes de água doce (63%) do que de peixes marinhos (37%). Além disso, 66% das espécies anunciadas não eram nativas do Brasil e quase um quarto (141) das espécies anunciadas tinha sua venda proibida de acordo com a legislação vigente no período de amostragem”.

Com relação ao status de conservação, foi observado que os anúncios ofereciam 23 espécies que são consideradas ameaçadas pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN); 16 espécies que constam nos apêndices da Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Silvestres Ameaçadas de Extinção (CITES); e 7 espécies que estão na Lista Oficial Brasileira de Espécies Ameaçadas de Peixes e Invertebrados Aquáticos.

Algumas das espécies ameaçadas que foram anunciadas eram o cascudo-zebra, criticamente ameaçada, de acordo com a lista brasileira); o pirarucu (listado no apêndice II da CITES); e o cavalo-marinho, considerado ameaçado pela lista brasileira e também listado no apêndice II da CITES.

Em relação ao preço dos peixes, foram encontrados valores que variaram entre R$ 0,09 e R$ 7 mil por indivíduo, sendo que os peixes marinhos são mais caros (preço médio de R$ 379,6 por indivíduo) que os peixes de água doce (preço médio de R$ 129,7 por indivíduo).

Anna Karolina Martins explica que os preços dos peixes são influenciados pela origem, porque as espécies exóticas são mais caras que espécies nativas; tamanho, já que peixes maiores são mais caros; e permissão, pois espécies cujo comércio é proibido são mais caras.

Segundo a pesquisadora, o comércio é uma das principais ameaças à conservação de animais no mundo inteiro e a internet tem ampliado o alcance e o impacto dessas atividades mercantilistas. Os resultados da pesquisa podem auxiliar na adequação da legislação, a fim de incluir a fiscalização adequada das atividades comerciais que são realizadas através de redes sociais.

“O fato de registrarmos anúncios envolvendo espécies de venda proibida evidencia a carência de fiscalização do comércio de animais em redes sociais. Esse resultado é alarmante, pois o comércio dessas espécies pode ser proibido por dois motivos. O primeiro refere-se a espécies consideradas ameaçadas de extinção. O outro motivo está relacionado a espécies que oferecem risco de invasão”, argumenta a pesquisadora.

“Como verificamos, mais da metade das espécies anunciadas não é nativa do Brasil e algumas delas são proibidas por serem consideradas potenciais invasoras, capazes de causar prejuízos à fauna nativa brasileira se porventura forem liberadas na natureza”.

Durante a pesquisa, nenhum tipo de contato foi realizado com os anunciantes e todos os dados coletados foram anonimizados. Os peixes foram identificados por especialistas, com base nas fotos disponibilizadas nos anúncios. Para verificar a permissão de venda das espécies inventariadas, foi considerada a legislação que regulamenta a captura e o comércio de peixes para fins ornamentais no Brasil.

“Escolhemos fazer o trabalho usando redes sociais, pois elas têm grande popularidade e facilitam a conexão entre consumidores e vendedores. E, apesar do crescimento do comércio on-line de animais, pouco se sabe sobre como ele se dá nessas plataformas, principalmente quanto à dinâmica das atividades comerciais e aos atores envolvidos”.

O status de conservação das espécies comercializadas foi verificado nos níveis nacional, na Lista Oficial Brasileira de Espécies Ameaçadas de Peixes e Invertebrados Aquáticos, Portaria MMA nº 445/14); e internacional, na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza/IUCN e na lista da Convenção sobre Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Flora e Fauna Selvagem/CITES).

Anna Karolina Martins defende que é necessário “atualizar a estrutura legislativa que regulamenta a exploração desses animais, incluindo diretrizes que abranjam a dinâmica do comércio através de redes sociais, e a educação dos consumidores sobre os risco que o comércio realizado de forma ilegal representa para a conservação”.

A pesquisa foi realizada durante o período do mestrado da pesquisadora, entre 2018 e 2020. Alguns colaboradores auxiliaram na identificação dos peixes e na análise dos dados, entres eles Franciany Braga-Pereira (bióloga e mestre em Ciências Biológicas/UFPB), Henrique Anatole Ramos (The Commission for the Conservation of Antarctic Marine Living Resources/Austrália), Luiz A. Rocha (California Academy of Sciences) e Ierecê Maria de Lucena Rosa (professora titular aposentada da UFPB). 

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Reportagem: Carlos Germano | Edição: Pedro Paz
Ascom/UFPB