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Egressa da UFPB descobre dois manuscritos inéditos da escritora Alba Valdez

publicado: 03/11/2022 14h34, última modificação: 07/11/2022 12h41
Textos foram encontrados em arquivo deixado por Mozart Monteiro, sobrinho da autora

Foto: Fotolia.swety 76

A egressa do curso de doutorado do Programa de Pós-graduação em Letras da (PPGL) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Keyle Sâmara descobriu recentemente dois manuscritos inéditos da escritora cearense Alba Valdez (1874-1962). Os textos foram encontrados em arquivo deixado por Mozart Monteiro, sobrinho da autora. Além desses originais, foram achadas outras produções literárias publicadas em jornais, revistas e almanaques de vários Estados brasileiros e de Portugal.

“Nossa pesquisa amplia a bibliografia da escritora, agregando produções que não constavam nas biografias e bibliografias que já circulavam. Outro resultado de relevância [do estudo] é a constituição das redes de sociabilidade que as mulheres escritoras formaram, das quais Alba Valdez fez parte, para possibilitar a publicação de suas produções literárias”, afirma Keyle Sâmara.

Dessas redes de sociabilidade, ela destaca associações literárias como a Liga Feminista Cearense e, sobretudo, a imprensa enquanto principal rede de sociabilidade das escritoras do século XIX e XX, no país. “A revista O Lyrio, por exemplo, na primeira década do século XX, em Pernambuco, reunia mulheres do Brasil inteiro, especialmente as nordestinas; tinham ainda os almanaques no país e no exterior, como o Almanaque de Senhoras, publicado em Portugal”.

Para Keyle Sâmara, a imprensa foi mais do que um suporte para as produções literárias das mulheres: influenciou diretamente nas características da escrita dessas mulheres e foi o espaço de maior visibilidade, sociabilidade e articulação, dando-lhes lugar de fala. “Há muita produção das escritoras brasileiras que, como Alba Valdez, tiveram nos jornais, revistas, almanaques seu principal meio de publicação”, avalia a hoje professora da rede estadual de ensino do Ceará.

A pesquisa teve início em 2015 e se resultou na tese intitulada Alba Valdez: a palavra das mulheres na história da literatura e da imprensa cearense, sob a orientação da professora Socorro Barbosa. Além da pesquisa bibliográfica, foram consultados diversos arquivos públicos, entre hemerotecas e bibliotecas.

Na Biblioteca Pública do Ceará, em dois setores, o de Obras raras e a Hemeroteca; na biblioteca da Casa Juvenal Galeno; na biblioteca da Academia Cearense de Letras; no Arquivo Público do Ceará; na biblioteca do Instituto do Ceará; nos arquivos da Diocese do Ceará, da Catedral Metropolitana de Fortaleza e dos cartórios de Fortaleza e visita ao Cemitério São João Batista de Fortaleza.

Em Pernambuco, foi necessário a visita e consulta ao Arquivo Público de Pernambuco. Em âmbito nacional, na hemeroteca da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, e na Hemeroteca Digital. Também foram executadas consultas online na Biblioteca Nacional de Portugal e no arquivo do jornal francês Le Matin.

Keyle Sâmara também considera que a pesquisa foi arqueológica, visto que foram garimpadas produções nos periódicos do Brasil e do exterior e a história de vida da autora a partir de biografias, notícias de jornais e das próprias produções da Alba Valdez, “que são ricas em suas memórias e escritas de si”, analisa a pesquisadora.

“Porém, apesar de toda sua notoriedade, após sua morte, como a maioria das mulheres que escrevem, ela é apagada, esquecida, cabendo aos pesquisadores acadêmicos assumir a importante missão de colocar essas mulheres e suas obras em evidência”, defende Keyle Sâmara.

Na concepção da docente, graças às lutas do grupo de escritoras cearenses pioneiras, do qual Alba Valdez fez parte, podemos constatar que a participação da mulher cresceu na Literatura e na Imprensa Cearense.

“Não é ainda o espaço devido, mas outras cearenses batalham pelo lugar de fala, cada uma no seu tempo e dentro das suas condições transgredem os paradigmas sociais e culturais não-equitativos”.

Nesse sentido, ela cita escritoras como Rachel de Queiroz, Ana Miranda, Tércia Montenegro, Natércia Campos; a cordelista, poeta e escritora Nezite Alencar, que compõe a Academia de Cordelistas do Crato, e as mulheres que fazem a Editora Aliás, em Fortaleza, como as escritoras Anna K, Virgínia Munhoz e a jovem enfermeira e autora Tici Pontes, que se destaca na escrita de livros digitais e que, com o expansão da internet, tem arrebanhado novas escritoras e leitoras e leitores, que não podem ser ignorados.

Biografia

Alba Valdez era pseudônimo de Maria Rodrigues Peixe, que foi professora, escritora e jornalista cearense. Nasceu em São Francisco de Uruburetama, uma cidade do interior do Ceará que hoje se chama Itapajé, no dia 12 de dezembro de 1874, e faleceu em Fortaleza, em 05 de fevereiro de 1962.

Ela mudou-se ainda criança, com os pais, para Fortaleza, devido à Grande Seca ocorrida no final da década de 1870, no Estado do Ceará. Estudou na Escola Normal, onde se formou professora em 1889, e publicou no jornal desta escola seus primeiros escritos com o pseudônimo “Mademoisele”, em 1888.

Também publicou em diversos jornais cearenses, de outros Estados brasileiros e do exterior, especificamente na Suécia, França e Portugal. Publicou também em revistas e almanaques brasileiros e estrangeiros, como no Almanaque das Lembranças Luso-brasileiro (1905).

Não se casou nem teve filhos. Publicou dois livros: Em Sonho (1901) e Dias de luz (1907), o primeiro tratando-se de uma coletânea de contos e crônicas publicados em periódicos; e o segundo é uma narrativa ficcional que envolve suas memórias como normalista.

Foi a primeira mulher a conquistar uma cadeira na Academia Cearense de Letras, em 1922. Porém, foi expulsa em 1930, sob a desculpa de uma reorganização e retorno de membros que haviam deixado o Estado.

Alba Valdez então protagoniza uma luta para retornar à Academia e foi eleita para instituição em 1937, depois de sua exclusão ter ganhado proporções nacionais através da publicação do texto De pé (1930) no jornal cearense Jornal do Comércio, no jornal A Nação e em outros periódicos. A escritora também foi a segunda mulher a fazer parte do Instituto do Ceará, uma associação de grande renome intelectual, artístico, histórico e cultural até os dias atuais.

A pesquisa de Keyle Sâmara traz em apêndice um levantamento das publicações da autora Alba Valdez e, em anexo, as transcrições das produções literárias inéditas que amplia sua bibliografia. O estudo foi financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Nota sobre Alba Valdez no Jornal do Brasil (1903)
Fonte: Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional (04/06/1903) Foto da Diretoria da Liga 

 

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Reportagem: Pedro Paz
Foto ilustrativa: Fotolia. swety76
Ascom/UFPB