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Foto de mulher ao celular com bengala para cego gera debate nas redes sobre deficientes visuais e smartphones
Foto de uma mulher carregando uma bengala de cego e olhando para o iPhone viralizou; usuários de redes sociais chegaram a duvidar que ela tivesse deficiência visual
Sarah Jenkins/ BBC News
4 fevereiro 2019
A imagem foi postada no Facebook em janeiro com os dizeres: "se você consegue ver o que está errado diga que viu o que é".
A jovem ativista Amy Kavanagh, de 29 anos, disse que ficou "brava e desapontada" com a postagem no Facebook. "Eu fiquei profundamente consternada com o fato de que uma pessoa com deficiência visual possa ser fotografada sem consentimento e humilhada por simplesmente estar cuidando da própria vida", disse.
A "piada" foi compartilhada 33 mil vezes, mas também gerou reações de pessoas com deficiência visual, que tentaram explicar que smartphones podem ser usados por quem não enxerga.
Kavanagh explica que "nem todas as pessoas com deficiência visual são totalmente cegas" e que a tecnologia as tornou ferramentas de grande ajuda para essas pessoas.
"Meu telefone é uma salvação. Eu uso várias funções de acessibilidade e aplicativos para ampliar o zoom. Consigo pedir taxi com ele, usar o GPS ou ligar para o meu parceiro quando estou perdida", exemplifica.
A jovem que mora em Londres afirma que é comum ver pessoas olhando ou apontado para ela. E que já chegou a ser acusada de fingir ser cega enquanto mexia no celular.
"É revoltante que as pessoas usem Siri ou Alexa (dispositivos de controle por voz) todos os dias, mas não consigam entender como uma pessoa cega usa o seu celular."
Veronica Lewis, de 22 anos, é uma estudante de Fairfax, Virgínia (EUA), que enxerga muito pouco e depende da bengala para se locomover com autonomia.
Para a jovem, a foto publicada no Facebook é uma "grosseira invasão de privacidade". Mas reconhece que não se surpreenderia se algo assim acontecesse com ela.
A estudante universitária foi diagnosticada com uma doença ocular quando tinha 3 anos de idade e, desde então, sua visão se deteriorou. Ela também tem um problema cerebral que afeta a capacidade de enxergar.
"Meu telefone me ajuda na adaptação", diz Lewis.
"Eu uso um tipo de óculos inteligentes que utiliza a câmera do meu iPhone para me ajudar a enxergar coisas. Também uso um app que me conecta com uma pessoa que enxerga no caso de eu precisar de auxílio ou ajuda."
Lewis explica que frequentemente usa o celular no ônibus para assegurar que está indo na direção certa. "As pessoas questionam como eu posso estar usando uma bengala de cego, se eu olho para o meu iPhone."
Ellen Fraser-Barbour, de Adelaide, na Austrália, tem deficiência visual e auditiva. Ela afirma que já foi acusada de fingir ou exagerar suas deficiências para obter "privilégios extras".
"Eu vejo pessoas fazendo comentários como: 'como você pode ser verdadeiramente cega, se você consegue enxergar o iPhone?", disse.
A estudante de doutorado conta que sua vida mudou com o uso de smartphones.
Ellen Fraser-Barbour precisa da cadela Inka para andar pelas ruas. Ela diz que já sofreu preconceito por ser cega e usar smartphones
"Antes dos smartphones eu me perdia constantemente, já que não consigo enxergar pontos de referência. E, sendo surda, acho difícil pedir direções", disse.
"Com um smartphone, eu consigo traçar cada movimento meu, acompanhando pelo meu aplicativo de mapa. Ele diz exatamente onde estou e para onde vou. Me deu uma independência inacreditável."
"Cegos usam celulares"
A ONG britânica Royal Nacional Institute of Blind People (Instituto Real Nacional de Pessoas Cegas) diz que frequentemente recebe relatos de pessoas cegas que enfrentam preconceito e discriminação por simplesmente viver o dia a dia.
O diretor de serviços da ONG, David Clarke, esclarece que pessoas com deficiência visual usam celulares, leem Kindle e veem televisão de maneiras diferentes.
"Precisamos educar os usuários de redes sociais e a sociedade em geral sobre os danos que postagens como essa podem causar. Histórias distorcidas e reações ignorantes podem abalar a confiança de pessoas cegas ou com capacidade reduzida de visão."