Notícias
Trabalhadoras sofrem mais com impactos econômicos da pandemia
A pandemia do novo coronavírus gerou diversos impactos na saúde e na economia. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no segundo trimestre deste ano, quando as medidas de isolamento social foram mais rígidas, quase 9 milhões de pessoas perderam seus empregos. Isso significa uma perda 9,6% dos trabalhadores em relação aos três primeiros meses de 2020.
Um estudo da empresa de fertilizantes Famivita apontou os impactos financeiros da pandemia para as brasileiras e constatou que 35% das mulheres perderam seus empregos durante esse período. A professora e pesquisadora do departamento de Serviço Social da UFPB, Leidiane Oliveira, atribui a predileção para demitir as mulheres ao ideal de divisão social e sexual do trabalho estabelecidos pelo capitalismo.
“Em uma lógica trabalhista de desmontes e antidireitos, a busca por lucros também aciona a opressão de gênero, em um processo que deslegitima as conquistas trabalhistas das mulheres. Então, entre garantir o emprego de alguém que se ausenta de quatro a seis meses, por exemplo, para licença maternidade e alguém que não passa por essas circunstâncias, é mais lucrativa a segunda opção”, avalia a professora.
Não é novidade que as mulheres têm dupla jornada de trabalho e com a pandemia essa situação se intensificou. A pesquisa “O trabalho e a vida das mulheres na pandemia” do site Gênero e Número identificou que 50% das mulheres passaram a cuidar de alguém durante o isolamento social; 80,6% passaram a cuidar de familiares, 24% de amigos e 11% de vizinhos.
Essa realidade atingiu mulheres como a administradora Leiliane Sobreira que teve de trabalhar de casa, assim que os decretos de contenção ao coronavírus ficaram mais rígidos. Ela é casada, tem uma filha de dois anos e com o isolamento social ficou a seu cargo também o cuidado do sogro de 82 anos. “Eu consegui trabalhar de cozinheira, babá, cuidadora, enfermeira, empregada doméstica; tudo, menos como administradora. Acabei sendo demitida da empresa, pois não estava cumprindo meus prazos e demandas”, conta.
A família dispunha do serviço de duas funcionárias, uma cuidadora e uma trabalhadora doméstica, que acabaram sendo demitidas como reflexo da crise financeira. Mesmo com as dificuldades, Leiliane ainda se sente privilegiada pelo fato do marido ter conseguido manter o emprego e assegurar uma parte da renda familiar.
Desigualdades entre as mulheres
A pandemia afeta mais as mulheres, porém evidencia as diferenças entre elas. Nem todas podem contar com o privilégio de apoio financeiro ou estão asseguradas do básico. Essa é a realidade da trabalhadora doméstica Denise Silva que cuida sozinha filho. Com a pandemia perdeu sua única renda e não teve seu pedido ao auxílio emergencial aprovado. “Eu tentei o auxílio, mas acho que por estar casada legalmente ainda pode ter contabilizado a renda do meu ex-marido”, acredita.
O levantamento da Famivit aponta que apenas 46% das mulheres que solicitaram o auxílio recebem ou receberam as parcelas de 600 reais, que poderiam subir para R$ 1.200 em caso de chefe de família. Inclusive, apenas 57% das mães com filhos pequenos receberam algum dos auxílios emergenciais do governo.
A dificuldade das mulheres conseguirem manter uma autonomia financeira é consequência da constituição desigual da sociedade, como explica a professora de psicologia e coordenadora de projetos de extensão sobre relações de trabalho Manuella Castelo Branco. “O sistema de trabalho capitalista se desenvolve baseado na divisão social e sexual do trabalho e patriarcalismo. O que acaba separando a esfera de produção e do trabalho para o homem e a esfera reprodutiva e do cuidado doméstico para a mulher, favorecendo a propriedade privada e o processo de acumulação, por via da exploração do trabalho das mulheres.”
A professora afirma que esses fatores não podem ser analisados isoladamente, uma vez que essa forma de exploração envolve diversos outros tipos de violências. “A desigualdade se expressa entre homens negros e brancos, mulheres negras e brancas, o que sinaliza para a gente que há também diferenças devido à estrutura racista do sistema de produção capitalista no Brasil.”, conclui. O levantamento do Gênero e Número aponta que 58% das mulheres desempregadas durante a pandemia são negras, 2,9% são indígenas ou amarelas e 39% brancas.
Na Paraíba, entre os meses de abril e julho foram desligadas 10.850 carteiras de trabalho de mulheres, segundo informações do Cadastro Geral dos Empregados e Desempregados, o CAGED. Quanto às admissões, nesse período, o SINE-PB revela que 24 homens conseguiram empregos enquanto as mulheres conseguiram 27 vagas. O saldo pode parecer superior, mas nos meses abril, junho e julho nenhuma mulher foi contratada através do SINE. Excepcionalmente o mês de maio foi marcado por essa alta. Em comparação com o mesmo período no ano passado, a diferença de contratação por gênero fica evidente. Dos 895 novos empregados, apenas 262 eram mulheres.
Gleyce Marques | Edição Lis Lemos