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Número de candidaturas femininas se mantém estável nas eleições de 2020

publicado: 14/10/2020 15h45, última modificação: 14/10/2020 15h45

O Brasil possui uma população formada por 52% de mulheres No entanto, esse número não reflete a quantidade de mulheres candidatas a eleição em 2020, Esse ano, as mulheres são 33% dos 500 mil candidatos. Em relação ao ano eleitoral anterior, a porcentagem de mulheres candidatas aumentou apenas 2%.

A pesquisadora e professora do departamento de Jornalismo da UFPB, Glória Rabay, explica que as mulheres foram historicamente relegadas ao espaço doméstico, deslegitimando a sua presença na política.“Desde a Antiguidade, a sociedade se acostumou a pensar que as mulheres só deveriam se encarregar das coisas domésticas, e assim, a decisão que diz respeito ao âmbito do social, ficou a cargo dos homens que criaram mecanismos, estratégias, regras e normas que dificultam até hoje a participação das mulheres”, afirma a pesquisadora.

Apesar de serem maioria na população brasileira, são poucas mulheres que ocupam cargos nos espaços da política estadual e nacional. Segundo uma pesquisa do Instituto Alziras, lançada em 2018, as mulheres enfrentam três níveis de dificuldade para serem eleitas. O primeiro nível é o da ambição política, o segundo são as barreiras do sistema político-partidário e da elegibilidade, e o terceiro ocorre após a eleição, que é a permanência ou a reeleição. “A gente tem que compreender até o próprio conceito de democracia, e questionar se é possível uma democracia que excluiu mais de 50% da população”, disse Glória Rabay. 

Faz apenas quatro anos que o Senado Brasileiro construiu o primeiro banheiro feminino, após 55 anos da sua inauguração. No ano anterior a construção, as 12 senadoras precisavam usar o banheiro do restaurante ao lado do plenário. Ao que parece, mulheres não eram esperadas nesse espaço e durante muito tempo tiveram suas necessidades básicas ignoradas.

A estudante de Jornalismo e pesquisadora de violência política de gênero, Juliana Lima, reforça a ideia de que a primeira barreira é entender que a mulher pode e deve se candidatar ou ocupar um espaço de poder na política. “A candidatura política para a mulher é muito complicada porque os ataques são muito mais baixos do que os ataques direcionados aos homens”, afirma a estudante.

Segundo a pesquisa do Instituto Alziras, realizada com prefeitas com mandato entre 2017 e 2020, aquelas que já ocupam esse espaço, encontram um ambiente propício para violências, revelando que 53% das entrevistadas já sofreu assédio ou violência política pelo simples fato de ser mulher.

Oportunidade, visibilidade e voz

Um problema enfrentado pelas mulheres é a falta de apoio interno dentro dos partidos. Desde a década de 1990, dispositivos foram  criados para que a presença feminina aumente dentro dos partidos, começando pela política de cotas que prevê uma candidatura feminina mínima de 30%. Outro exemplo é a decisão tomada pelo STF, que diz que os recursos do fundo partidário devem ser destinados para essas candidaturas, proporcionalmente.

Para a estudante Juliana Lima, falta apoio para que as mulheres ocupem definitivamente o espaço político. “A gente percebe que ainda é um processo muito lento de apropriação do espaço político por mulheres. E não é só se candidatar a cargo eletivo, mas também estar presente em executivas de partido, é serem presidentas, vice-presidentas e secretárias gerais”, reflete Juliana que também é filiada a um partido político 

De acordo com a pesquisadora Glória Rabay, o problema está na estrutura do sistema. “As mulheres possuem menos oportunidades para se candidatar e quando se elegem, possuem menos chances de subir no palanque, ocuparem a mídia, acessar recursos partidários e financiadores de campanha”, examina.

Ataques contra mulheres são mais violentos na internet

Nos últimos anos, as campanhas políticas se direcionaram em grande parte para a internet e as novas possibilidades de se comunicar com o eleitorado. Em 2020, por causa da pandemia do coronavírus, isso se intensificou. Entretanto, essas ferramentas também foram utilizadas para difundir discurso de ódio e desinformação, chamada também de fake news.

“[As fake news] atingem as mulheres de uma forma mais agressiva, porque como a gente vive em uma sociedade machista, ela  atuam na questão da sexualidade, na questão do gênero”, relata a jornalista e membro do Coletivo Intervozes, Mabel Dias, que escreveu um artigo sobre o discurso de ódio contra a vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018.

No caso da vereadora, cujo assassinato permanece sem resolução, vários boatos sobre o seu suposto envolvimento com o tráfico de drogas começaram a circular pelas redes, além de outras formas de tentar depreciar a sua imagem, atacando sua sexualidade e maternidade. Todos os insultos, feitos inclusive por personalidades públicas e membros do Congresso Nacional, foram desmentidos pela mídia na época.

A pesquisadora Mabel Dias explica que são as crenças conservadoras que agridem trabalhos de mulheres feministas na política. “Existe um ataque muito grande em relação ao feminismo, uma desconstrução do que é o feminismo de fato por essa corrente conservadora que vem se consolidando no Brasil e no mundo. Isso aconteceu nas eleições dos Estados Unidos e teve o modelo copiado para o Brasil”, avalia. 

Pesquisa divulgada em 2018, realizada pela Universidade de Southamptom, Inglaterra, revelou que no Brasil, 81% das vítimas de racismo no Facebook são mulheres negras de classe média e com ensino superior completo. Um dos eventos que desencadeiam os posts racistas é a mulher estar em uma posição de liderança.

Grace Vasconcelos | Edição: Lis Lemos